Wednesday, July 05, 2006

Uma nota antes da semifinal com a França

A geração de oiro que emergiu dos Sub-21 de Riyad, em 1989, tal como a sua congénere Jugoslava vencedora no Chile em 1987, foi um alvo a abater. Mais ainda o passou a ser, com a repetição da vitória em 1991. Isso tornou-se evidente em 2000 e 2002, e já antes pela maneira como fomos eliminados do apuramento para 1998, em Berlim. Se houve nomes como Pauleta e Figo que passaram mais ou menos incólumes por tudo aquilo que, de fora como de dentro, se fez para que a selecção A não colhesse os frutos da sua geração de oiro, outros houve que foram muito prejudicados e das mais diversas maneiras — Rui Costa, Abel Xavier, Kenedy, só para citar casos mais evidentes.

E porquê? Porque o negócio do futebol vê em mavericks como Portugal (e a Jugoslávia de então) um empecilho para os grandes lucros que as grandes vitórias podem trazer nos países mais ricos (Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Espanha, Estados Unidos, Austrália, Japão). Em 1998 e 2000 isso resultou nas vitórias de treta conseguidas pela França. De treta, porque consentidas pelos adversários (sobretudo em 1998 isso foi evidente, mas nós que o digamos em 2000). Em 2002 foi o que se viu com Portugal, o seleccionador António Oliveira retirando-se a coxear depois da derrota com a Coreia e dizendo entre dentes «ao menos salva-se o negócio». Em 2004 deram-nos o rebuçado da final, mas também já só restava Figo e Fernando Couto.

Mourinho vaticinou a nossa derrota com a Holanda, muitos nem pensaram sequer na possibilidade de ultrapassarmos a Inglaterra, agora toda a gente se cala. Excepto a França, com medo de perder. Eu próprio me rendi à evolução desta selecção desde que começaram a jogar neste mundial. A tal geração intermédia, que não tinha dado nas vistas nas fases jovens (a carreira de Pauleta é o exemplo máximo de humildade e sacrifício, até chegar ao Bordéus onde tem conquistado várias vezes o título de melhor jogador do campeonato), se com uma ponta de arte a menos que a geração de Paulo Sousa, Pedro Barbosa, Fernando Couto, Paulo Bento, Vítor Baía, Figo, Rui Costa, João Pinto, tem o benefício da maturidade que ao longo dos anos a instituição selecção A foi ganhando. E joga com a garra, coesão e consistência que raramente tivemos no passado.

Há quem dê loas a Scolari pela carreira desta selecção. Para mim, ou o Scolari conseguiu com a selecção portuguesa aquilo que obviamente não conseguiu com a do Brasil em 2002 (como disse muito bem Maradona na altura, não houve boas equipas, e o Brasil valeu-se de alguns valores individuais para ganhar), ou existe algo mais que atravessou estes tempos muito complicados de emoções desencontradas. Inevitavelmente, há que lembrar a maneira como Carlos Queiroz saiu de seleccionador nacional, quando se deixou das falas mansas habituais para dizer que a Federação Portuguesa de Futebol tinha de mudar. E, sem tirar os méritos a Scolari, é por aí que eu vou quando vejo a carreira da selecção A neste mundial: o estágio em Évora, as bocas de Madail sobre o atraso do autocarro na auto-estrada, e o sangue-frio dos jogadores em campo, são pontas de um iceberg que talvez se tenha formado a partir da conquista do direito a organizar o Euro 2004: é óbvio que se concretizou uma nova maneira de estar na impecável realização com que a FPF honrou esse direito, e gradualmente a equipa tem vindo a beneficiar disso. Se isso veio ao encontro dos relatórios que Queiroz ia fazendo na altura, é possível, o que importa mesmo é esta nova maneira de estar.

Perante isso, só resta olhar para aos clubes de futebol e para a Liga e dizer-lhes: aprendam com a FPF, mudem a partir de dentro, e talvez o nosso campeonato também venha a ser melhor. Assim, terão as bancadas cheias mesmo quando não é jogo grande.

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